Resposta ao Barros: Dawkins e a Moral

O Barros afirmou aqui coisas que eu gostaria de comentar.

“Isso é um argumento? Você poderia, da mesma forma, dizer que as pessoas variam em matéria de fedor, mas que nós só poderíamos fazer a comparação em referência a um máximo perfeito de fedor concebível. Portanto, tem que haver um notavelmente fedorento sem igual, e nós o chamamos de Deus. Ou substituir qualquer dimensão de comparação que você queira, e chegar à mesma conclusão tola.

O teu exemplo diz que só podemos comparar o fedor tendo como referência um fedorento sem igual. Mas isto não se aplica no que toca o Bem e o Mal uma vez que uma as razões pela qual só Deus é Qualificado para distinguir o Bem do Mal é a de que Ele é Infinitamente Bom.

No exemplo que deste a analogia mais realista seria se Deus fosse 100% Bem Cheiroso, e conhecedor de todos os cheiros possíveis e imaginários. Nesse caso, Ele poderia distinguir o fedor do não fedor e indicar o cheiro a atingir.

Do mesmo modo, como Deus sabe todos os comportamentos morais possíveis e imaginários, só Ele pode definir em termos absolutos o que é o Bem e o Mal. Para além da Sua Palavra, todas as outras opiniões são relativas.

Perceba que Dawkins — como você equivocadamente afirmou — não está avaliando se Aquino estava certo ou errado. Ele só estava mostrando que isso não é, de fato, um argumento, pois, afinal, por que só poderíamos comparar valores se admitirmos, primeiro, que TEM QUE HAVER algo que represente o MÁXIMO daquele valor em comparação?

Mas não é isto que eu digo, portanto a analogia falha por ser um falso dilema.

Pergunta-te uma coisa: no que toca à moral, Deus é o Máximo de quê exactamente?

Esse “tem que haver” fomos nós, seres humanos, que colocamos lá. A realidade não precisa desse “add-on”. É isso.

Então se não existe nenhuma referência absoluta para distinguir o bem do mal, isso significa que toda a moral é relativa. Isso quer dizer que em certas situações, torturar bébés pode ser moralmente aceite. Concordas? Ou será que torturar bébés é absolutamente errado? Se dizes que está absolutamente errado, tens que dizer o que é que o torna absoluto. Lembra-te que as opiniões humanas são relativas.

Esse é o ponto que eu tinha em mente.

Para vêres como o ateísmo não tem resposta para a moral absosluta, lembra-te do programa do Dawkins “The Root of All Evil”. Qual foi a moral que ele usou para classificar de “evil” as religiões? Foi a sua própria moral ateísta.

A pergunta faz-se: quem é que disse que o mal e o bem é definido por aquilo que o Dawkins decide ser o mal e o bem? Quem é que decidiu que “as religiões” (seja lá o que isso fôr na boca do Dawkins) são “a raiz do mal”? Se Deus não existe, isso é apenas a opinião pessoal, subjectiva, relativa, provavelmente emotiva de um ser humano limitado. As opiniões de Dawkins são vinculativas só para ele.O problema levanta-se quando começamos a classificar pessoas como o Hitler e Stalin de “maus”. Qual é a moral que usamos para fazer isso? A nossa? Mas a nossa moral podem ser diferente da do Hitler e da do Stalin. Como é que decidimos quem tem razão? Existe alguma moral que transcende as culturas, as épocas, os costumes e as religiões? Se não existe, então o Hitler se calhar era moralmente justo. Pelo menos era o que ele pensava. Quem somos nós para o criticar, certo? Cada um com a sua moral. Uns gostam de sumo de laranja outros gostam de matar judeus. Quem somos nós para impôr a nossa moral a outras culturas, certo?

Ou não?

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"Posterity will serve Him; future generations will be told about the Lord" (Psalm 22:30)
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9 Responses to Resposta ao Barros: Dawkins e a Moral

  1. Barros says:

    Na verdade, o exemplo não é meu, como você escreveu. É de S. Tomás de Aquino; Dawkins só o reformulou de forma a mostrar que ele é um não-argumento. Por falar em Dawkins, não foi ele que escolheu o título do programa da BBC: “The Root of All Evil”. Foi a emissora. Ele diz isso no livro “Deus, um Delírio”, como diz, também, que discordou do título desde o começo.

    Respondendo a sua pergunta, não considero Deus o máximo de nada, porque não há essa necessidade para as coisas continuarem existindo. E acho muito estranho você dizer coisas como “Do mesmo modo, como Deus sabe todos os comportamentos morais possíveis e imaginários, só Ele pode definir em termos absolutos o que é o Bem e o Mal“, pois, ao que parece, você espera que eu aceite — e não aceito — a ideia de que, em existindo um Deus Todo-Poderoso que criou o universo e o governa, você saberia o que se passa na cabeça dele, o que ele pode fazer e o que não pode, e o modo como avalia as coisas… Isso é inconcebível. Acho estranho também a ideia de chamar de “infinitamente bom” um suposto ser que preparou com cuidado um lugar onde os seres que criou seriam torturados eternamente caso não acreditassem na existência dele, mesmo ele não dando provas dela.

    Quanto à moral, ela é ditada pelas sociedades sim. É o conjunto de pessoas que vivem em sociedade que determina o que é certo e o que é errado. Quem tem razão e quem não tem. Se alguma vez existiu uma sociedade que considerava moralmente aceito torturar bebês, podemos seguramente supor que esses bebês seriam suficientemente debilitados física e psicologicamente a ponto de não sobreviverem numa razão que deixasse essa sociedade com um número positivo no seu crescimento demográfico ao ponto de, em um x número de gerações, eles estarem cada vez mais com menos habitantes gerando bebês para eles torturarem, até o ponto da extinção. Caso resolvessem ultrapassar os limites da sua sociedade e entrar em outra como a nossa para torturarem nossos bebês, eles seriam presos ou, simplesmente, executados, dependendo da lei vigente em cada sociedade. De uma forma ou de outra, uma sociedade torturadora de bebês não duraria muito tempo, evolucionariamente falando. Acabariam extintos. É assim que funciona a evolução. A moral que conhecemos hoje, a que aceitamos como certa, é a que “deu certo”, a que permitiu que continuássemos como espécie.

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  2. Saracura says:

    muito interessante barros. Imagina se precisamos de Deus para sermos corretos?..Não…Somos frutos da educação e dos costumes, também da limitação da lei…Imagina se fossem todos “crentes” não aprovariam a lei que permite testes com célula tronco..só porque estamos brincando de DEus! Podemos brincar o quanto quisermos…ciência não pode ter as mesmas limitações da religião ou da interpretração de Deus..
    abraço

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  3. Joana says:

    “Cada um com a sua moral. Uns gostam de sumo de laranja outros gostam de matar judeus. Quem somos nós para impor a nossa moral a outras culturas, certo?”

    Dúvida: Matar judeus como os nazis na segunda guerra mundial? Ou matar judeus como nos pogroms cristãos do séc. XVI? Será que a moral que determinou os dois extermínios era igual? Será que alguma delas, segundo os padrões actuais de moralidade (cristã ou outra), é admissível? Que base moral justifica os actos dos cristãos de então? A moral vinda de deus não é superior, absoluta, perfeita e imutável desde o início dos tempos? Então deve ser a mesma no séc. XVI e hoje…

    Moral, moral… que a tem, chama-lhe sua!

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  4. Mats says:

    Barros,

    você espera que eu aceite — e não aceito — a ideia de que, em existindo um Deus Todo-Poderoso que criou o universo e o governa, você saberia o que se passa na cabeça dele, o que ele pode fazer e o que não pode, e o modo como avalia as coisas… Isso é inconcebível.

    Eu sei (parcialmente) o que Deus pensa sobre a moral da mesma forma que eu sei (parciamente) o que tu pensas sobre a moral: ELe revelou-nos isso (na nossa consciência e na Sua Palavra). DO mesmo modo tu revelaste aos outros o que tu pensas sobre a moral.
    Parece-te inconcebível que Deus possa comunicar com os seres humanos? Deus não tem problemas de comunicação, Barros. Nós humanos é que temos problemas em aceitar o que Ele diz.

    Quanto à moral, ela é ditada pelas sociedades sim

    Então o que Hitler fêz era moralmente correcto porque a sociedade onde ele vivia assim o via? Portanto tu não vês problema nenhum em matar pessoas por causa da sua etnia?

    Se alguma vez existiu uma sociedade que considerava moralmente aceito torturar bebês, podemos seguramente supor que esses bebês seriam suficientemente debilitados física e psicologicamente a ponto de não sobreviverem numa razão que deixasse essa sociedade com um número positivo no seu crescimento demográfico ao ponto de, em um x número de gerações, eles estarem cada vez mais com menos habitantes gerando bebês para eles torturarem, até o ponto da extinção

    Por outras palavras, seria moralmente correcto torturar bébés? Tu concordas com a tortura de bébés, Barros? QUal é a finalidade?

    De uma forma ou de outra, uma sociedade torturadora de bebês não duraria muito tempo, evolucionariamente falando. Acabariam extintos.

    Hitler também não durou muito tempo. Isso quer dizer que o que ele fêz estava errado? Dito por outras palavras, segundo o teu pensamento, se uma práctica moral dura tempo, isso é sinal de que é moralmente válida?

    Por exemplo, a pedofilia existe há muito tempo. Concordas com a pedolifia, Barros? OU será que o tempo não serve como régua de medir no que toca a moral?

    As minhas perguntas mantém-se: se Deus não existe, como é que podemos definir em termos absolutos o que é o bem e o mal?

    Já vimos que o tempo e a sociedade não servem. Se achas que sim, então tu achas moralmente certo torturar bébés e violar crianças,

    COmo é que ficamos?

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  5. Mats says:

    Saracura,

    muito interessante barros. Imagina se precisamos de Deus para sermos corretos?..

    Mas se Deus não existe, eu não sei se estás a ser correcto ou não. Sem Deus, não há Ponto de Referência Absoluta para a moral. Aquilo que tu chamas de “correcto” pode ser incorrecto para outra pessoa.

    Como é que dividimos as águas em termos absolutos?

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  6. Adão says:

    “Sem Deus, não há Ponto de Referência Absoluta para a moral.”…

    Mas como há vários deuses… de Javé a Alá, passando por todas as divindades hindus e animistas das religiões africanas e australianas e afins, lá se foi o único ponto de referência absoluta… afinal há muitos pontos de referência absoluta… tantos quanto as culturas humanas…

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  7. Rui says:

    Meus caros, vocês estão fazendo o que muitos na gênese da sociedade grega dita “evoluída”, e até hoje referência acadêmica, já praticavam; aprimorando o poder de persuadir o outro a partir de seus ideais. O mais importante ainda é a questão do discenso, pois é a partir dele que nossa espécie evolui, domina e transforma a natureza e em alguns momentos, paradoxalmente, até involui. Destarte, meus caros amigos, tiremos como exemplo os grandes doutores da retórica que discursavam pelo simples prazer do bem dizer e falar. Respeitando um ao outro apesar de não concordar com a argumentação alheia: “posso até não concordar com o que vc diz, mas defenderei com toda minha vontade o seu direito de dizê-lo” (autor desconhecido) . Por que não absovemos o que cada filosofia tem de bom, ainda que o bom , seja relativo, tanto ao tempo, ao espaço e à circunstância? Por que não usamos o “equilíbrio” pregado pelos orientais, ou o amor ao próximo como prega a fé cristã? Por que não observamos de forma cética, assim como o ateu o faz, aqueles dogmas que retardam a evolução de nossas ciências humanas e naturais? Talvez a resposta um tanto que imediatista não preencha nossos anseios toda plenitude, pois somos seres de emoções, sensações e reflexões racionais, claro que às vezes um predomina mais que outro, mas os somos. E a para explicar tanta riqueza seria necessário mergulharmos na filosofia, na psicologia, na antropologia, na neurociência , na sociologia , na arqueologia, na teologia e outras ciências mais. Ainda assim, não teríamos a verdade absoluta, pois como escrevi no início, o que importa aqui é o discenso.
    Então meus caros, vivamos em harmonia, amando o outro, buscando o equilíbrio, a racionalização das idéias, a fé no imaginário.

    PS: Não distorçamos o que se está sendo escrito aqui para que de forma tendenciosa seja usada como objeto de controle. Refiro-me ao texto do nobre Barros, que foi interpretado erroneamente pelo nobre colega Mats quando usou a técnica socrática de questionamentos, quando na verdade estava afirmando suas proposições. Acredito que todos tenham entendido a analogia, um tanto que chocante, diga-se de passagem, usada pelo nobre Barros.

    Viva ao DISCENSO.

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  8. Mats says:

    Adão,

    “Sem Deus, não há Ponto de Referência Absoluta para a moral.”…

    Mas como há vários deuses… de Javé a Alá, passando por todas as divindades hindus e animistas das religiões africanas e australianas e afins, lá se foi o único ponto de referência absoluta… afinal há muitos pontos de referência absoluta… tantos quanto as culturas humanas…

    Então concordas que em certas sociedades que assim o defendam a tortura de bébés é moralmente válida?

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  9. Adão says:

    E que tem deus a ver com a denúncia e a rejeição de atrocidades?

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